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Álcool e adolescência VII: Sinais precoces do alcoolismo na adolescência

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2.3. Sinais precoces do alcoolismo na adolescência

2.3.1. Considerações preliminares

Inicialmente deve-se considerar algumas dificuldades e limitações quanto ao uso dos marcadores biológicos, das escalas de avaliação e dos marcadores da quantidade de consumo e álcool.

Por exemplo, alguns fatores não relacionados ao abuso de álcool podem interferir nos resultados da ?-GT, como o uso de certos medicamentos, principalmente anticonvulsivantes e anticoagulantes (Litenn et al, 1995 e Chand et al, 1997) e outras condições fisiopatológicas. Também, não se tem certeza ainda porque em pacientes do sexo masculino há uma relação inversa entre a dosagem da CDT e a severidade das doenças hepáticas (Nalpas et al, 1997) (Citado por ROTH, RESEM & PERES, 2001). Assim, tais resultados exigem uma interpretação cautelosa das alterações nos valores de referência (ROTH, RESEM & PERES, 2001). Outra limitação é que nem sempre há uma disposição do indivíduo aceitar a realização desses testes laboratoriais com fins específicos de detectar o consumo de álcool, pois geralmente há uma tendência das queixas estarem desvinculadas do problema do uso do álcool, e a realização dessas provas requer o livre consentimento do indivíduo depois de devidamente informado.

Quanto aos marcadores da quantidade de consumo de álcool, eles se referem aos riscos à saúde física. Embora o uso regular de álcool dentro dos parâmetros que não constituem risco à saúde (física), por sua vez, no decorrer do tempo, pode implicar no aprendizado do beber e, num futuro, constituir um quadro de alcoolismo. Uma dificuldade quanto a esses marcadores, é que adolescentes ou jovens podem estar consumindo bebidas alcoólicas em grupos de colegas, o que dificulta ao certo a quantidade de gramas de álcool ingerida. Além disso, há uma tendência não só do jovem, mas da maioria das pessoas que consomem álcool, minimizar sobre a quantidade consumida. O mesmo se refere às Escalas para avaliação do consumo de álcool. O adolescente que está consumindo álcool, de maneira a causar a preocupação dos pais, geralmente não é receptivo à ajuda dos familiares quando tentam encaminhá-lo para um profissional ou a um serviço especializado.

No trabalho que realizamos na Clínica Mirante do Instituto Bairral de Psiquiatria - Itapira - SP com dependentes de substâncias psicoativas, ao pesquisar a história de vida de pessoas em tratamento por alcoolismo, foi possível encontrar nessas histórias subsídios para identificar sinais ou indicadores relacionados ao consumo do álcool na época da adolescência dessas pessoas. Acreditamos que se tais indicadores fossem conhecidos e, assim, trabalhados na época da adolescência dessas pessoas, talvez fosse possível impedir o avanço e a configuração do quadro de alcoolismo atual.

2.3.2. O adolescente fraco (sensível) e o adolescente forte (tolerante) para o beber

Embora seja conhecidos atualmente alguns fatores de risco e de proteção do adolescente em relação às substâncias psicoativas, é necessário enfatizar que além da disponibilidade e da propaganda, é fácil o acesso à bebida alcoólica pelos adolescentes, ou seja, a vulnerabilidade sócio-cultural ao álcool. Também, não é demais repetir um dado importante: não existe consumo de álcool sem risco, ou, não é necessário ser um alcoolista para se ter problemas com bebida alcoólica.

Na adolescência, quando das primeiras experiências com a bebida alcoólica, há o adolescente fraco e o adolescente forte em relação ao álcool.

O adolescente fraco (sensível) para o beber é aquele que com uma ou duas doses de bebida alcoólica já se sente alterado e, ao mesmo tempo, pode passar mal com isso. Não consegue então beber mais que isso, porque não se sente bem. No dia seguinte ao uso ou ao abuso de álcool, o fraco para o beber não pode ver bebida alcoólica em sua frente. Sente os efeitos do álcool: mal estar, dor de cabeça, problemas abdominais, indisposição.

O adolescente forte (tolerante) para o beber é o que suporta beber quantias maiores sem muita alteração. Desenvolve também, com o aprendizado de beber, a tolerância comportamental, quer dizer, a capacidade de executar tarefas mesmo sob o efeito do álcool (SHUCKIT, 1999). É aquele que é enaltecido pela turma pelo fato de agüentar a beber. É o que ajuda a levar para a casa um colega que não passou bem com a bebida, isto é, o colega fraco para beber. No dia seguinte, o forte para o beber, mesmo sentido alguns efeitos do consumo de álcool do dia anterior, mostra disposição para beber novamente.

Conforme apresentado na figura 1, quando qualquer efeito de uma substância psicoativa é reduzido em magnitude sobre o comportamento, referimos à tolerância (Goudie, 1989). Já a sensibilização é o aumento em magnitude de qualquer efeito da substância sobre o comportamento (Citado por SILVA, GUERRA, GONÇALVES & GARCIA-MIJARES, 2001). Ou seja, a tolerância é a diminuição do efeito da substância psicoativa conforme é consumida de forma repetida, sendo necessário que seja com mais freqüência e em maiores quantidades para se obter o efeito desejado. Na sensibilização a resposta a uma substância psicoativa é mantida mesmo que se diminua a quantidade da substância consumida.

No exemplo, as primeiras administrações da droga têm o efeito de aumentar a resposta; à medida que a droga continua sendo administrada, o organismo pode desenvolver tolerância (linha cinza) ou sensibilização (linha preta). A linha pontilhada indica o momento em que a droga começou a ser administrada.

Na tolerância, o álcool é um reforço positivo, fazendo com que aumente a freqüência de consumo. No decorrer do uso, o valor reforçador do álcool, emparelhado com outros estímulos ambientais, desenvolve condicionamentos e reforçadores secundários. Conforme se instala a dependência, o álcool passa a ser um reforçador negativo, pois alivia o organismo dos sintomas de abstinência. Na sensibilidade, o álcool pode ser um reforçador positivo, mas os efeitos ruins experimentados pelo organismo decorrentes do uso do álcool, pode tornar o álcool um estímulo aversivo.

O fraco para beber, assim por sua sensibilidade, impõe-se um limite quanto à bebida. O forte não. Sempre está disposto a beber. E ao ser enaltecido pelo grupo de convivência como alguém que é forte para beber, já que a adolescência é um período de auto-afirmação, sente-se elogiado com isso, o que reforça seu comportamento de beber.

Constatamos que as pessoas em tratamento que desenvolveram um quadro de dependência de álcool - diagnosticados geralmente na vida adulta, portanto depois de anos e anos de uso e abuso de álcool - são os que na juventude mostraram tolerância ao álcool e por isso mantiveram o comportamento de aumentar cada vez mais o consumo de bebida até surgirem os sintomas de dependência do álcool e os problemas decorrentes: físicos, desorganização da vida, perdas ou ameaças de perdas, por exemplo emprego, separação conjugal, condutas agressivas, condutas irresponsáveis, entre outros.

Por que há adolescentes sensíveis ao álcool enquanto outros são tolerantes?

É possível que a resposta esteja nas diferenças individuais quanto à vulnerabilidade biológica, isto é, do organismo ao álcool.

Por exemplo, os orientais adultos não têm uma enzima necessária ao metabolismo do açúcar do leite. Não se sabe se esse é o fundamento, mas a cozinha chinesa não tem molhos à base de leite, ou seja, os chineses não têm hábitos alimentares que envolvam açúcar do leite. Os europeus adultos geralmente têm essa enzima. Os bebês possuem essa enzima, mas certas populações perdem após o desmame. Os chineses não passam bem depois de saborear um prato europeu à base do açúcar do leite, comum na Europa. Por sua vez, os europeus quando saboreiam um prato oriental, apresentam uma reação alérgica conhecida como a "síndrome de restaurante chinês"pois os orientais utilizam nos seus hábitos alimentares grandes doses de glutamato monosódico para acentuar os sabores da comida. Talvez os europeus adultos não tenham a enzima que metabolize o glutamato monosódico? (WALLACE, 1978). Haveria algo de natureza semelhante com o álcool?

É conhecido como Rubor Oriental quando das reações fisiológicas desagradáveis ao álcool (rubor cutâneo, náuseas, taquicardia e queda da pressão arterial). Tal poderia ser um fator de proteção contra o álcool, Entretanto, apesar de chineses e coreanos apresentarem respostas de rubor ao álcool, são observadas, entre chineses e coreanos, baixas e altas taxas de alcoolismo, respectivamente. A questão cultural teria um papel relevante? (FRANCES & FRANKLIN, 1992).

O álcool etílico, no fígado, é convertido em aldeído acético, e que por ação da enzima acetoaldeído desodrogenase, é transformado em acetato. A pessoa normal, em relação ao consumo de álcool, teria nível baixo desta enzima, o que elevaria a concentração de aldeído acético, responsável por rubor facial intenso, queda de pressão, palpitações, vômitos, tonturas, aumento da freqüência cardíaca (MASUR, 1986). Não são conhecidas as razões ou as causas de indivíduos serem sensíveis ou tolerantes ao álcool. Do ponto de vista do comportamento, entretanto, a sensibilidade e a tolerância ao álcool são um fato.

Ainda, um dado importante: o adolescente sensível ou o tolerante que, durante ou após o consumo de bebida alcoólica, apresenta alterações cognitivas, de humor ou comportamentais, causando preocupação aos colegas e ao ambiente, por exemplo, agressividade verbal ou física, prejuízo da crítica pessoal e social, perda da consciência, não terá no futuro um problema com o álcool, pois já o tem no presente.

Embora o que expomos seja um estudo teórico, a identificação desses parâmetros precoces do alcoolismo no adolescente que consome bebida alcoólica pode ser de importância para a prevenção e também para fomentar pesquisas quantitativas para confirmar ou infirmar a hipótese apresentada.

 

 

 

 

 

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